O aparecimento do Pico e a forma dos seus vulcões

04/06/2022

Sob o ponto de vista geotectónico o arquipélago encontra-se na “Junção Tripla dos Açores”, ou seja, encontra-se entre as Placas Litosféricas Norte-Americana, Euroasiática e Africana. A esta área os cientistas dão o nome de Microplaca dos Açores e é delimitada pelos 2000 mil metros de batimetria, numa área de 5,8 milhões de km2.

Enquadramento geográfico e geotectónico


A formação da Microplaca dos Açores


Começou há 36 Ma com a migração para Norte do ponto ou zona de junção das placas até à posição atual. Poderá ter surgido com um ponto-quente que evolui para uma área muito dinâmica, constituída por diversas falhas que provocam inúmeros sismos e episódios de ascensão do magma à superfície. Nesta zona do planeta, o magma que esta retido no manto e que está sempre em movimento devido às correntes de convecção, ascenda à crusta por fendas e falhas, com maior probabilidade e em maior quantidade que noutras zonas. No entanto, a ascensão desse magma pode não ser suficiente para uma erupção, mas pode ficar contido e acumular.

Os diferentes tipos de magma


A constituição do manto de onde vem o magma é formada por silicatos de Fe e Mg, ou seja, são rochas ultrabásicas, sendo a constituição da crosta maioritariamente mais rica em sílica e alumínio e magnésio. A crosta oceânica é assim quimicamente mais básica que a crosta continental, o que dá origem a magmas mais básicos e consequentemente as erupções são de lavas mais fluidas. Ou seja, em situações “normais” em zonas de crosta oceânica quando há vulcanismo, o magma será sempre básico. A diferença entre o magma e a lava é a desgaseificação, quando o magma perde os gases e vem à superfície passa a denominar-se de lava.

O aparecimento do Pico e a forma dos seus vulcões


As ilhas do Faial e do Pico emergiram de uma fratura tectónica de orientação ONO-ESE – denominada Fratura Faial Pico, uma estrutura do tipo falha transformante que se desenvolve ao longo de 350 km, desde a Crista Média do Atlântico (CMA) até uma área de fundos aplanados situada a sul da Fossa Hirondelle. A formação da Ilha do Pico começou há 300 mil anos, com um incremento da produtividade lávica de estilo fissural e submarino. O complexo vulcânico Topo-Lajes engloba o vulcão do Topo. Que hoje tem uma área de cerca de 18km2 e uma altura de 1 022m é um vulcão em escudo, resultante essencialmente da sobreposição de escoadas lávicas. Como as lavas são fluidas do estilo pahoehoe afasta-se muito da cratera, sendo a sua área maior que área do Estratovulcão da Montanha do Pico.

Figura 3- Vulcão do topo, vulcão de lavas básicas, extremamente erodido. O lado direito apresenta-se com uma escarpa de falha, em que a sua queda e deslize deu origem à caldeira de Santa Barbara.
Figura 3- Vulcão do topo, vulcão de lavas básicas, extremamente erodido. O lado direito apresenta-se com uma escarpa de falha, em que a sua queda e deslize deu origem à caldeira de Santa Barbara.


Com o decorrer da atividade, o vulcanismo torna-se progressivamente mais explosivo, manifestado por erupções estrombolianas em torno do vulcão, segundo alinhamentos NE-SW a NNE-SSW, e no topo, a partir da caldeira. Estima-se que a atividade do vulcão do Topo terá cessado há cerca de 5 000 anos (França et al., 2005). Apresenta duas importantes depressões a (1) Caldeira de Santa Bárbara, com uma forma circular, correspondendo a uma caldeira de abatimento ligeiramente basculada para Sul e (2) as Terras Chãs. No interior das depressões há a registar edificações de cones secundários associados a acidentes tectónicos NE-SW que afetaram a escarpa da falha do Arrife e o próprio bordo NE das Terras Chãs. A NW e a S do Vulcão do Topo regista-se um maior número de cones adventícios, a salientar, o "spatter cone 405” que foi responsável pela emissão de lavas que originou à fajã lávica mais recente, a Fajã das Lajes. O Castelete é mais um desses cones vulcânicos que se formam por libertação de gases e retenção da lava já mais viscosa. Conseguimos ver junto ao castelete mais para Oeste a estratificação intercalada de magma básicos e erosão de solo.

Figura 1- Vila das Lajes, erigida sobre uma escoada de lavas básicas e do lado direito um cone vulcânico, fortemente erodido.
Figura 1- Vila das Lajes, erigida sobre uma escoada de lavas básicas e do lado direito um cone vulcânico, fortemente erodido.


O Complexo Vulcânico São Roque-Piedade é composto por uma cordilheira edificada aquando a fase subaérea das erupções do vulcão do Topo. Isto porque, à medida que o vulcão do Topo crescia, simultaneamente para E e W, iam se instalando os cones vulcânicos sobre as fraturas WNW-ESE. Estima-se que a fase subaérea ter-se-á iniciado há cerca de 230 000 anos e continuado até 1562/64, com a erupção do mistério da Prainha (França et al., 2005). O Planalto da Achada, que se estende desde o lado leste do vulcão da montanha até à Ponta da ilha, apresenta-se sob a forma de uma zona de topo aplanado cuja altitude vai progressivamente diminuindo para Oriente e cujas vertentes apresentam inclinações acentuadas. O estratovulcão da Montanha do Pico corresponde a um vulcão com 2 351m de altitude e um diâmetro máximo da base ao nível do mar de 16km, as inúmeras erupções do tipo havaiano e estromboliano ocorridas, bem como, os movimentos de massa na parte superior do cone e a subsidência da cratera justificam a sua morfologia atual. Aquando da segunda fase do último episódio vulcânico ocorrido no topo da Montanha do Pico, de características fissurais e direção N115oW (França et al., 2005), instalou-se, no interior da cratera, um cone lávico de 125m de altura designado por Piquinho. Erupções havaianas - Magma básico, efusivas, lava fluido, menos de 1% de água, escoadas lentas Erupções estrombolianas- Vulcanismo medianamente explosivo e com períodos efusivos. Estratovulcão forma-se em forma de cone e das suas erupções mistas. Nas imediações do aparelho vulcânico principal encontram-se cerca de 170 cones de escórias e spatters dispostos radialmente. Constata-se que há uma relação inversamente proporcional entre o número de cones e a altitude e, ainda, que muitas vezes estes encontram-se alinhados na direção WNW-ESSE (França et al., 2005).

Mistérios


Mistério de São João- corresponde às escoadas lávicas basálticas do tipo aa (com alguma acidez, e água envolvida) produzidas durante a erupção que se iniciou a 1 e 2 de fevereiro de 1718, antecedida por diversos sismos e a abertura de numerosas fendas no terreno entre as freguesias de São Mateus e São João. A erupção vulcânica terminou em janeiro de 1719, formando uma saliência na linha de costa sul da ilha do Pico entre os lugares de Terra do Pão e Companhia de Cima, e cobrindo uma área de 2,2 km2 . O centro emissor desta erupção corresponde ao cone de escórias do Cabeço de Cima, a uma cota de cerca de 250 m. As erupções fora do tipo fissural, havaiano-estromboliano a 11 de fevreiro abriu-se uma boca no mar. Duas pessoas morreram.

Figura 2- No lado direito temos um pequeno cabeço que originou o mistério de São João, ao centro o estratovulcão e mais à direita um pequeno cabeço que originou o mistério da Silveira.
Figura 2- No lado direito temos um pequeno cabeço que originou o mistério de São João, ao centro o estratovulcão e mais à direita um pequeno cabeço que originou o mistério da Silveira


Mistério da Silveira - Corresponde às escoadas lávicas basálticas do tipo aa produzidas durante a erupção que se iniciou a 10 de julho de 1720, após várias semanas de sismos sentidos pela população. A erupção vulcânica terminou a 18 de dezembro do mesmo ano, cobrindo uma área de 4,6 km2 na parte sul da ilha, a oeste da vila das Lajes do Pico, para onde a população fugiu atempadamente. O centro emissor de 1720 corresponde a um cone de escórias situado a uma cota de cerca de 350 m, o Cabeço do Fogo, com 3 crateras de explosão principais no topo, dispostas segundo uma direção geral ONO-ESSE. Podemos ainda ver ao longo da costa, marcas da intercalação entre atividade vulcânica e períodos de erosão.

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João Pelica

Professor